Coragem, Convicção e Esperança
Por Daisaku Ikeda
Todos, suponho, têm recordações da mocidade. Com efeito, de outra forma, dificilmente se poderá dizer Ter vivido ao menos seus anos de jovem. Eu, como todos os mais, tive meu quinhão. Minha família era pobre, e meus quatro irmãos mais velhos foram todos convocados pelo Exército e mandados para a frente de batalha. Em conseqüência, eu não dispunha de dinheiro nem de tempo para freqüentar a escola da maneira normal. Em vez disso, trabalhava durante o dia e, com o dinheiro que conseguia, freqüentei a escola comercial, e mais tarde o colégio à noite. Minha saúde não era muito boa. Apesar disso, tentei dar conta do recado o melhor possível. Houve ocasiões em que, cuidando de pequenos encargos para a companhia onde trabalhava, tinha de caminhar lentamente ao longo de Ginza puxando uma carreta grande. Outras vezes, lembro-me de Ter apenas uma camisa de gola aberta para usar, mesmo quando os ventos de outono começavam a soprar. Mas não sentia vergonha ou constrangimento algum. Pelo contrário, via-me como personagem de um drama -um jovem, sorrindo e lutando contra as durezas da vida, e chegava a orgulhar-me. Com efeito, estou certo de que as dificuldades que tive de enfrentar na época me ajudaram a construir os alicerces de meu atual estilo de vida. |
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Na ocasião, tinha uma certa convicção...não, seria mais exato chamá-la uma resolução. Acreditava que a juventude não era algo para ser vivido em vão. Estava decidido que, mesmo pobre e surrado, caminharia de cabeça erguida, aproveitando qualquer estímulo que pudesse achar e viveria a vida o mais plenamente possível. Essa determinação, que serviu como apoio na época, mantenho imutável hoje em dia. Pondo de lado todas as considerações acerca de posição, riqueza e reputação, a vitória final reside em saber que se está fazendo o melhor possível como ser humano, e essa é a maior vitória de todas. Trata-se de algo que não pretendo esquecer até o término de mus dias.
Quando olho em retrospecto para os dias de minha mocidade, há coisas que me fazem parar para refletir. Para começar, gostaria que em minha adolescência e juventude tivesse estudado mais, particularmente as matérias fundamentais. Certamente eu percebia como era importante a mocidade, e achava que estava lendo inúmeros livros. Mas agora me arrependo de não Ter lido dez ou vinte vezes mais. Também gostaria de ter-me exercitado mais e enrijecido meu corpo.
Com a ajuda de uma compreensão tardia, percebo agora quão extremamente importante é o período da adolescência. Quem sabe não seria exagero dizer que todo o restante da vida da pessoa é determinado pela maneira como passa os anos da mocidade.
Os jovens se acham em pleno processo de formação, mas por isso mesmo se acham não-acabados. São quantidades desconhecidas, plenas de possibilidades. Os jovens trazem consigo os ventos da mudança e da reforma, e são possuidores de enorme e irreprimível vitalidade. Há pouca coisa capaz de igualar a grandeza da mocidade. Mas se um jovem negligenciar na construção e passar o tempo todo em bobagens, ou se for excessivamente cautelosa em suas metas e permitir-se ficar fraco ou ineficiente, então é culpado, poder-se-ia dizer, de suicídio espiritual. Nenhuma outra linha de ação poderia ser mais superficial e inadequada.
Temos de perceber que todo jovem que vive é até certo ponto animado pelas paixões juvenis que lhe circulam pelas veias. Se apenas direção e finalidade firmes puderem ser dadas a essas paixões, então sem dúvida os jovens poderão aprender a contribuir para o bem-estar da sociedade e a viver vidas realmente significativas. Muitos líderes de hoje, contudo, embora prontos para criticar os moços, parecem dispensar escasso tempo para pensar em seus próprios malogros e deficiências. Só pensam em sua própria fama e proveito, trabalham apenas por sua própria glória e progresso, e não entendem absolutamente os corações e mentes dos jovens.
Isto pode parecer uma afirmativa bastante impertinente para se fazer. Mas gostaria de mencionar que, em um trabalho escrito há dez anos, tive ensejo de observar o seguinte: "Não pode haver dúvida quanto ao surto e queda da nação e a prosperidade e declínio da época serem em grande parte determinados pelo grau de consciência própria de parte da juventude e da direção que ela segue. (...)
Há, contudo, um fato que nunca deve ser esquecido: o de que sejam quais forem os esforços construtivos em que possamos nos empenhar, eles devem ser invariavelmente buscados sob a inspiração e orientação dos mais elevados ideais e dos mais capazes líderes. Sem tais ideais e sem líderes assim, a paixão e a vitalidade da mocidade, independente da idade que se esteja vivendo, serão despendidas em atividade inútil. E se os jovens forem induzidos a seguir falsos líderes e ideologias, então partirão para motins e destruição com a violência de uma impetuosa torrente."
É direito de cada indivíduo buscar sejam quais forem os ideais, filosofia e líderes que desejar. Fico entristecido apenas pelo fato de que os homens hoje investidos em poder político sejam incapazes de oferecer o quer que seja aos jovens. Parece-me que eles precisam dedicar mais atenção e meditação sobre o rumo a que estão levando o povo deste país. Não acredito que a tendência dos acontecimentos mundiais permitirá ao Japão prosseguir indefinidamente em seu presente estado de espírito de prosperidade pacífica porém irresponsável.
Baseado em minha própria experiência, diria que as qualidades mais indispensáveis à juventude são coragem, convicção e esperança. Ação corajosa por parte dos moços é a fonte de que tudo mais é criado. E é a convicção que orienta e apóia a coragem. Encarando a sociedade de hoje, quantas inúmeras pessoas vemos desprovidas de convicção! Uma vida dedicada exclusivamente a bajular outros e a concordar com as opiniões deles é tão oca e sem valor quanto espuma na crista de uma onda. A convicção não conhece hesitação nem confusão de metas. E este gênero de convicção é algo que brota naturalmente dos esforços concretos de uma pessoa para cumprir suas responsabilidades e missão na vida. Finalmente, uma vida sem esperança, um jovem que sente não ter futuro, é pouco mais do que um cadáver vivente. Os maiores homens são aqueles cujos anos juvenis estão cheios de sonhos e ideais, e que continuam no decurso de suas vidas a perseguir tais sonhos e ideais.
Os jovens são o tesouro de uma nação, a riqueza da era do porvir. Não há poder comparável ao valor desse tesouro. Fazer qualquer coisa capaz de ameaçar o futuro desses jovens, ou privá-los do seu vigor, equivale a lançar nossos próprios tesouros ao mar. E os líderes que vão realmente um passo adiante e mandam os jovens para o campo de batalha, onde preciosas vidas são perdidas para sempre, por certo merecem ser chamados de os homens mais perversos do mundo.
Tenho grande afeição pelos jovens, e minha maior alegria é observá-los crescendo. A visão deles amadurecendo em um ambiente de saber, paz e felicidade faz meu coração dar pulos de alegria. É minha esperança atual poder passar o resto da vida caminhando lado a lado com os jovens e respirar o ar que respiram. E se puder, afinal, vê-los ascender à plataforma que construirmos juntos e pairar no ar, um por um, pela causa da paz e do progresso cultural do mundo, conhecerei a satisfação de minhas esperanças, a consecução de minha maior alegria.
IKEDA, Daisaku, "Crianças de Vidro e Outros Ensaios" (páginas 50, 51, 52 e 53) Editora Record
Preciosa Colaboração de Wellington Sversut de Bauru-SP.
e-mail: wrs@blv.com.br
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