O rei Fértil e a rainha Sivali  
Capítulo
I
[Renascimento de um Bodhisattva]


Uma vez, na cidade de Mithila,  havia um rei que tinha dois filhos. O filho mais velho chamava-se Fruta-Ruim e seu irmão mais novo, Fruta-Pobre.

Enquanto eles eram ainda bem jovens, o rei coroou o mais velho como príncipe. Ele era o segundo em comando e o próximo na lista para o trono. O príncipe não coroado, Fruta-Pobre, tornou-se comandante do exército.

Finalmente o velho rei morreu e o Príncipe Fruta-Ruim tornou-se o novo rei, enquanto seu irmão Fruta-Pobre passou a ser o príncipe coroado.

Pouco depois, um certo servente tomou-se de antipatia pelo príncipe coroado e foi ao rei Fruta-Ruim contar-lhe uma mentira -  que seu irmão estava planejando matar a ele, o rei. A princípio, o rei não acreditou nele, mas, de tanto o servente repetir essa mentira o rei ficou amedrontado e então mandou acorrentar o Príncipe Fruta-Pobre e trancá-lo na masmorra do palácio.

O Príncipe pensou, " Eu sou um homem bom e não mereço estas correntes. Nunca quis matar meu irmão. Nem sequer zangado com ele eu estava. Portanto agora eu invoco o poder da verdade. Se o que eu digo é verdadeiro, que estas correntes se soltem e as portas da masmorra sejam abertas!" Miraculosamente a corrente se quebrou em pedaços, a porta se abriu, e o príncipe fugiu para uma afastada vila.  O povo de lá o reconheceu e o ajudou, uma vez que o respeitavam, e o rei não pôde capturá-lo.

Apesar de viver escondido, o príncipe coroado tornou-se o mestre daquela remota região. Com o tempo ele formou um grande exército e pensou, "Embora no início eu não tenha sido um inimigo do meu irmão, agora devo sê-lo." Então, ele tomou seu exército e cercou a cidade de Mithila.

Mandou uma mensagem para o Rei Fruta-Ruim - "Eu não era seu inimigo, mas você me tornou um. Apesar de que eu vim para fazer guerra contra você, lhe dou uma chance - dê-me sua coroa e seu reino, ou venha para fora e lute." Ouvindo isto, a maioria do povo da cidade saiu e juntou-se ao príncipe.

 

O Rei Fruta-Ruim decidiu pela guerra pois ele faria qualquer coisa para manter seu poder. Antes de sair com seu exército, ele foi despedir-se da sua rainha principal. Ela estava grávida, esperando um nenê para muito breve. Ele lhe disse, "Meu amor, ninguém sabe quem irá vencer esta guerra, portanto se eu morrer você deve proteger esta criança dentro do seu útero." Então, bravamente ele partiu para a guerra e foi rapidamente morto pelos soldados de seu irmão inimigo.  

A novidade sobre a morte do rei se espalhou através da cidade. A rainha disfarçou-se de uma pobre e suja mendiga, cobrindo-se de velhos farrapos de pano e lambuzando-se de sujeira. Colocou algum ouro do rei e as suas mais preciosas jóias numa cesta e as cobriu com arroz sujo de modo que ninguém pudesse querer roubar. Então ela deixou o palácio carregando a cesta na mão. O sol ainda nem havia nascido e ninguém a reconheceu.

Ela deixou a cidade pelo portão do norte. Como havia vivido sempre dentro da cidade, não tinha a mínima idéia para onde ir. Ela tinha ouvido falar de uma cidade chamada Campa, então, sentou-se ao lado da estrada e começou a perguntar se alguém estava indo para Campa.

Acontece, porém, que aquela criança que estava para nascer não era um nenê comum. Não seria esta sua primeira vida nem seu primeiro nascimento. Milhões de anos atrás,  tinha sido um seguidor de um mestre, há muito esquecido,  'Buda - o  Iluminado'.  Ele havia desejado de todo o coração se tornar um Buda justamente como seu amado mestre.

Ele havia renascido em muitas vidas - algumas vezes como pobres animais, algumas vezes como antigos deuses viventes e outras vezes como seres humanos. Ele sempre tentou aprender com seus próprios erros e a desenvolver as "Dez Perfeições," de modo a poder purificar sua mente e remover as três raízes causadoras da perniciosidade – os venenos da avidez, ira, e a ilusão de um ego separado. Desenvolvendo a Perfeição, ele poderia algum dia ser capaz de substituir os venenos com as três purezas – desapego, gentileza e sabedoria.

Este "Grande Ser" havia sido um humilde seguidor do esquecido Buda. Seu intento era alcançar a mesma iluminação de um Buda - a experiência da Verdade completa. De modo que as pessoas o chamavam de "Bodhisattva", que significa um " Ser Iluminado".  Ninguém sabe na verdade sobre quantas milhões de vidas foram vividas por este grande herói, mas muitas histórias têm sido contadas, incluindo esta sobre uma rainha grávida que estava para trazê-lo à luz. Após muitos outros mais renascimentos, ele tornou-se o Buda que é lembrado e amado nos dias de hoje em todo o mundo.

Na época desta nossa história, o Ser Iluminado já havia completado as Dez Perfeições, portanto a glória de seu próximo nascimento causou um estremecimento em todos os mundos celestes, incluindo o Céu dos 33 reinos governado pelo Rei Sakka. Sendo um deus, quando ele sentiu o estremecimento, sabia que isto fora causado pelo nenê ainda por nascer, dentro do ventre da disfarçada Rainha de Mithila. Também sabia que este seria um ser de grandes méritos. Então ele decidiu ir, e ajudar.

O Rei Sakka fez uma carruagem coberta, colocou uma cama dentro, e apareceu no lado da estrada em frente a grávida rainha, como um simples homem velho e gritou, "Alguém precisa de uma carona até Campa?" A desabrigada rainha respondeu, "Eu desejo ir para lá, gentil senhor." O velho homem disse, "Então venha comigo."

A rainha grávida estava bem pesada com sua barriga, uma vez que o nascimento estava próximo. Ela disse, "Não posso subir na carruagem. Simplesmente carregue minha cesta e eu irei caminhando atrás." O velho homem, o rei dos deuses, respondeu, "Não se preocupe! Eu sou o mais sabido motorista por aqui, portanto apenas entre na minha carroça!" Eis que, assim que ela levantou o pé, magicamente o Rei Sakka fez o chão sob ela subir e então facilmente ela conseguiu subir na carruagem.!  Imediatamente ela percebeu que este devia ser um deus, e adormeceu.

Sakka dirigiu a carruagem até chegar a um rio. Então ele acordou a senhora dizendo, "Acorde filha, e banhe-se neste rio. Vista-se nestas finas roupas que eu lhe trouxe e depois coma um pouco de arroz." Ela o obedeceu e depois deitou-se para dormir um pouco mais.

À tardinha ela acordou e viu casas e paredes altas e perguntou, "Que cidade é esta, pai?" Ele respondeu, "Esta é Campa." Ela perguntou novamente, "Em tão pouco tempo?, eu havia ouvido falar que o caminho para Campa era bem longo." Rei Sakka respondeu, "Eu tomei um atalho.Agora que estamos no portão do sul da cidade, você pode entrar a salvo. Eu devo seguir adiante para minha distante vila." Então eles se separaram e Sakka desapareceu na distância, retornando ao seu mundo celeste.

A rainha entrou na cidade e sentou-se numa hospedaria.  Alí em Campa vivia um sábio homem que recitava palavras encantadas e dava conselhos para ajudar as pessoas doentes ou desafortunadas. Ao caminhar para se banhar no rio, com os seus 500 seguidores, ele viu a linda rainha à distância. A grande bondade do ser ainda não nascido dentro dela dava-lhe um doce e caloroso brilho, notado apenas pelo sábio homem. De pronto ele sentiu um carinho e uma gentil amizade por ela, como se ela fosse sua própria irmã mais nova. Então ele deixou seus seguidores no lado de fora e entrou na hospedaria.

Ele perguntou-lhe, "Irmã, de qual vila você vem?" Ela respondeu, "Eu sou a rainha principal do Rei Fruta-Ruim de Mithila." Ele perguntou, "Por que você veio aqui, então?" Ela disse, "Meu marido foi morto pelo exército de seu irmão, Príncipe Fruta-Pobre, e eu estava com medo e decidi fugir para proteger o filho não ainda nascido que trago dentro de mim." O sábio homem perguntou, "Você tem algum parente nesta cidade?" Ela disse, "Não, senhor." Então ele disse, "Não se preocupe de jeito nenhum. Eu nasci numa rica família e eu próprio sou rico e tomarei conta de você como o faria pela minha própria irmã mais nova. Agora, você deve chamar-me de irmão, agarre-se aos meus pés e grite."  Quando ela assim o fez, os seguidores vieram para dentro. O sábio homem então explicou-lhes que ela era sua irmã mais nova, desaparecida há muito tempo. Disse aos seus seguidores mais próximos que a levassem para sua casa numa carruagem coberta e que dissessem a sua esposa que esta era sua irmã, e que necessitava ser cuidada.

Eles fizeram exatamente como ele disse. A esposa a recebeu, deu-lhe um banho quente, e a fez descansar na cama.

Após banhar-se no rio o sábio homem retornou à casa. Durante o jantar ele convidou sua irmã para juntar-se a eles. E, após o jantar ele a convidou a hospedar-se em sua casa.

Em apenas poucos dias a rainha deu à luz a um maravilhoso menino e deu-lhe o nome de Fértil. Ela disse ao sábio homem que este era o nome do avô do menino, o qual uma vez fora Rei de Mithila.  

Veja o Capítulo II - Ganhando o Poder  e o Capítulo III Abrindo Mão do Poder


A tradução deste texto é uma preciosa colaboração de 
Teresinha Medeiros dos Santos - Felppondd@aol.com 
Com ilustração de Sandro Neto Ribeiro contato@maisbelashistoriasbudistas.com 

Referências  bibliográficas


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